quarta-feira, 21 de setembro de 2016

ARQ (2016)



As vezes acho que o que acontece na minha vida está se repetindo eternamente. Comecei a ter essa sensação depois dos trinta e essa percepção só tem crescido nesses últimos cinco anos; com os mesmos problemas no trabalho, mesmos problemas nos relacionamentos, mesmos problemas de grana, mesmas histórias contadas nos aniversários e churrascos da vida; acho que se eu não tivesse meu filho do lado para acompanhar seu crescimento, eu poderia ter certeza de que estou dentro de um loop temporal e que em determinada época do ano (Shazan!!) o tempo volta para um exato dia e lá vamos nós outra vez.
Só que nem todos tem a sorte de possuir um totem, como um filho, um peão que não para de girar, ou perceber uma falha na matrix, para saber se o que está vivendo é real, sonho ou repetição; e, esse é exatamente o caso que acontece com os personagens do filme "ARQ", escrito e dirigido por Tony Elliott e estrelado por Robbie Amell e Rachael Taylor, que a Netflix produziu e disponibilizou em seu catálogo no último dia 16/09.

O filme começa assim: Robbie Amell é Renton, um jovem, bonito e malhado cientista que acorda com um susto em seu quarto as 06:16, ao lado da não menos gata Hannah (Rachael Taylor), ele houve barulho na porta e de repente três homens com mascaras de gás entram e um deles desfere uma coronhada no rosto de nosso protagonista e o arrastam pelos pés em direção a outro comodo; Renton se agarra nos pés do corrimão da escada e tenta fugir, mas acaba tropeçando, bate de cabeça no degrau e ( katapow!!) acorda com um susto em seu quarto as 06:16, ao lado de Hannah , ele houve barulho na porta e de repente três homens com máscaras de gás entram e um deles desfere uma coronhada no rosto de nosso protagonista....

O que foi escrito na humilde sinopse que antecede esse parágrafo não foi um erro de digitação, o que ocorre com Renton (ou Ren, para os mais chegados) é um loop temporal. Sendo assim, Ren percebe ,após "morrer" na escada, que o dia que ele está vivendo vem se repetindo e, não importando o que faça, ele sempre morre e acorda as 06:16 ao lado de Hannah na cama de seu quarto. Ren começa a suspeitar de que o "Arq", um projeto que buscava gerar energia ilimitada e do qual fez parte quando trabalhava na maior corporação mundial, a Torus, e que roubou quando saiu fugido da empresa, está, de alguma maneira fazendo com que o dia se repita. Sabendo desse eterno restart, o protagonista passa a usar as informações do dia repetido para buscar uma chance contra os invasores, mas o que Ren vai poder fazer quando todos os invasores, repetição após repetição, começarem a lembrar também de que o dia está se voltando?

"ARQ" remete a outras produções que também exploram a ideia de loop temporal, como o clássico "O feitiço do tempo", onde Bill Murray fica preso no dia da marmota em uma cidade do interior americano, ou ao episódio "segunda-feira" do Arquivo X, onde após uma assalto frustrado a um banco, um ladrão detona explosivos presos a seu corpo, matando Mulder e Scully e, fazendo com que a segunda-feira se repita diversas vezes, ou mais recentemente, com "No limite do amanhã" onde após entrar em contato com alienígenas, o personagem de Tom Cruise, passa a voltar no tempo sempre que morre. No entanto, o diferencial de "ARQ", talvez seja pensar no micro, tornando a história menos grandiosa e mais intimista, concentrando o filme em apenas um cenário e tendo somente seis atores em ação. Essa proposta menos grandiosa dá ao filme espaço para explorar bem os personagens e apostar em polt twists que aos poucos vão revelando, além da personalidade de cada um, as peculiaridades do universo onde o filme se passa.



Achei o filme divertido e interessante. Confesso que a principio fiquei um pouco confuso, pois somos jogados no meio da situação sem nenhum aviso prévio, mas o final da trama, tanto justifica totalmente essa imersão repentina, quanto acrescenta qualidade ao roteiro e a opção de montar o filme da forma que foi feito. Gostei especialmente do fato de o roteiro se prender ao momento vivido pelos personagens e a busca por resolver a situação onde eles estão presos, deixando todos problemas de fora da casa como um pano de fundo que justifica a invasão e confronto, algo parecido com o que acontece no filme "Colateral" onde Tom Cruise (toda hora esse cara) é um assassino contratado por mafiosos que persegue e mata testemunhas, sendo o que o levou até ali é ignorado, ou o livro "Battle Royale" de Koushun Takami, onde o importante é o que acontece na ilha em que estudantes devem se matar até sobrar apenas um e o estado totalitário que está por trás de tudo é apenas mencionado em pequenos trechos, sem importância para a trama.

Hannah e Ren
Mas embora a situação fora da casa não tenha maior importância para a trama de "ARQ", achei todos os conceitos apresentados e que revelam o estado da sociedade mundial ,do universo do filme, extremamente interessantes. Para começar, os três antagonistas estão usando máscaras de ar e nos é informado durante a história, de que o ar está tão poluído, que é impossível andar pelas ruas sem uma proteção adequada, da mesma forma sabemos através de um noticiário, que passa durante uma das tentativas de fuga (ou todas) de que todas as aves foram extintas e que a "Austrália continental" virou um buraco de "cascalho radioativo" graças a um bombardeio nuclear. No entanto, o que chama a atenção é saber que a "Torus", maior conglomerado de empresas do mundo e onde o protagonista trabalhava, é tão poderosa, que praticamente engoliu os EUA e detêm o poder sobre a cidadania e liberdade das pessoas, sendo o único opositor a essa potência, um grupo terrorista autointitulado "O bloco". Essas informações, que transitam ao fundo da história dão ares de distopia ao universo onde a trama se realiza, o que me agradou em muito, por sincronizar perfeitamente com o desfecho que a história tem.

Bem, como eu disse, gostei bastante de "ARQ" e poderia falar bem mais sobre todos os por menores do filme, mas acho que uma hora ou outra eu acabaria me repetindo (piadinha). O filme é uma produção simples e divertida, que consegue segurar o expectador com o mistério e tensão de uma situação inusitada, aborda um quase gênero de ficção científica de forma divertida e interessante e tem um final que mistura desespero com coragem. Um ótimo trabalho de Tony Elliott, de quem eu só conhecia a direção de alguns episódios de "Orphan Black" e uma produção digna da netflix, que tem apostado em todos os gêneros com a mesma qualidade. Então, quando bater uma vontade de ver um filme repetido, mude um pouco a sua ideia e assista "ARQ" e dê chance para o que é um pouco diferente, porque ninguém quer viver em um loop temporal, assim como eu, pois se eu pudesse falar da minha vida, eu começaria assim:

As vezes acho que o que acontece na minha vida está se repetindo eternamente....




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