sábado, 22 de agosto de 2015

Geração Sherlock

 Quando eu era adolescente li “um estudo em vermelho”, a primeira história do Sherlock Holmes e me diverti muito com a descrição que Sir Arthur Conan Doyle, através da boca do Dr Watson, fazia do detetive. Segundo ele, Sherlock era totalmente focado em sua ciência, sabendo tudo sobre plantas, em especial as venenosas, era tão hábil que desenvolveu um teste sanguíneo para identificar criminosos (isso no século 19), estudava a mente de bandidos para traçar paralelos, estudava os tipos de terrenos e disfarces , em resumo era um gênio de sua área e um profissional extremamente produtivo e eficaz (exceto no livro do Jô Soares, diga-se de passagem).
Nem tão competente, nem tão genial

 No entanto, conforme a história avançava e se multiplicava em outros contos eu ia observando que aquele foco extremo pelo trabalho ia se transformando em obsessão e essa em frustração, a ponto do maior detetive da literatura inglesa só conseguir relaxar através do uso de drogas, sacrificando sua vida pessoal e até sua higiene (pelo que se entende do filme do Guy Ritchie) e eu pensava: “Se fosse na vida real, esse cara morreria de infarto ou de um AVC em menos de um ano, tamanho stress que ele se cerca .”
Cool e só

  Mal sabia eu que o padrão de pessoa produtiva, mais de vinte anos após eu ler o livro, seria o padrão Sherlock Holmes, onde a sociedade cobra um foco total em algo que a gente faz, ignorando ou ridicularizando qualquer válvula de escape, qualquer momento a parte, e, assim as pessoas, frustradas e pressionadas pela obrigação social de nunca sair do personagem produtivo e genial, vão buscando em derivados de valium, prozacs e seus semelhantes, drogas menos exóticas do que as usados pelo famoso detetive, o alívio que, simplesmente ser quem são as daria. E essa falta de liberdade e certeza de uma obrigação desumana vai se apresentando a uma geração inteira como a queda d'água onde Sherlock encontrou o seu fim, nos puxando para baixo e nos fazendo desaparecer na escuridão e ruido de quem nos coloca com últimos dentre seus interesses.
Cachimbo da paz


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