segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

"Gravidade" - O melhor filme de 2013

  O filme “Gravidade” , do diretor Alfonso Cuarón, me atraiu desde o primeiro trailer, com o perdão do trocadilho; O Teaser mostrando astronautas a deriva no espaço, indo descontrolados e desesperados em direção de uma estação espacial ,me deixou empolgado por ser ,a primeira vista, um filme de ficção científica com um bom diretor e um elenco de peso, mas com medo de que viesse a ser um blockbuster no pior estilo Armagedom. Por sorte, não se tratava de uma coisa nem outra, “Gravidade” é sobre a vida.
  O filme apresenta da Dra. Ryan Stone ( Sandra Bullock ) uma especialista recrutada pela NASA e seus colegas de missão, incluindo o experiente Matt Kowalski (George Clooney ) para auxiliar na atualização do telescópio Hubble . Na véspera do retorno para a terra, terminando o trabalho, a tripulação é informada de que a Rússia destruiu um satélite espião desativado com um míssil, o que gerou uma reação em cadeia que vai destruir tudo que existe em seu caminho, incluindo a nave e a tripulação da missão. Como toda boa ideia, o roteiro do filme é bem simples, mas a profundidade de seus conceitos foi o que me ganhou e tenho certeza foram eles o que levaram o filme a ser um dos campeões de indicações ao Oscar.
Seguindo em frente

  Desde o primeiro instante que somos apresentados a Dra. Ryan, sabemos que ela está no automático, ignorando seus problemas pessoais e a situação extraordinária onde se encontra, ela não é diferente de qualquer outra pessoa que encontramos na rua, indo trabalhar porque se deve trabalhar , voltando para casa por que se deve voltar; Ela não sente nada, ou pelo menos não demonstra emoção (mesmo sendo privilegiada com as mais belas visões) ela apenas segue em frente, Então para arrancá-la desse estado de letargia a vida interage da única maneira que sabe, causando problemas. Esses problemas são representados por toneladas de lixo espacial vindo em direção a tudo que dava segurança a protagonista naquele momento e quando a nuvem de destroços chega até a nave , chega sem fazer barulho (até porque no vácuo não há som) e vem destruindo tudo e fazendo vítimas, assim como os problemas que enfrentamos em nosso cotidiano. Tal como a personagem ,muitas vezes gostamos de acreditar que temos total controle de nossos vidas, que não vamos ser surpreendidos facilmente, isso faz com que nos sitamos mais seguros para caminhar em linha reta por nossas vidas, no entanto um diagnóstico médico, um acidente de trânsito ou a demissão do emprego, vem sempre a nos mostrar o quanto frágil e ilusória é essa nossa ideia de controle, de modo silencioso e sem mandar aviso, os problemas sempre chegam e alguns acima de 32 mil km/H.
 Após ser arrancada da nave , junto com o braço mecânico que a sustentava, e jogada ao espaço, a primeira decisão que a protagonista tem de tomar é se soltar desse último elo com o que lhe dava segurança anteriormente, assim como uma pessoa que sai de qualquer situação em que está envolvida, seja pessoal ou profissional (como diria Fausto silva) , tem de  largar de lado as lembranças que a prendem ao passado e ir em frente, é o que acontece a ela a se desconectar do braço mecânico, mas, assim como qualquer um de nós ao sofrer uma mudança brusca, a protagonista se sente a deriva, jogada no espaço e  sem chão , mas quem assiste de outra perspectiva pode dizer que ela está na verdade livre e quando o Tenente Kowalski surge para resgatá-la é que sua viagem de volta a vida começa.
"você está à deriva, ou está livre?"

  Após  prender a Dra. Stone em si, Matt Kowalski toma rumo ao que sobrou da nave espacial , na esperança de que a mesma ainda pudesse levá-los para casa, no entanto se depara apenas com destroços e corpos, de maneira que a única forma de encontrarem salvação é alcançar a estação espacial internacional e de lá partir até a estação chinesa, que possivelmente ainda possuí módulos de emergência, isso contando apenas com alguns impulsos do Jetpak utilizado por Kowalski e com o Oxigênio da DRa Ryan Stone a 8% . É no percurso até a primeira estação, onde está a cena mais linda do filme, para acalmar a colega,  Matt pergunta de onde ela veio e se tem alguém especial esperando por ela lá embaixo, a resposta, falada lentamente pela Dra Stone, deixa claro o porquê de seus gestos automáticos e indiferença:

 “Eu tinha uma filha.”

O mundo fica de cabeça para baixo quando a vida nos derruba
 Se aproximando da estação internacional ,  Kowalski informa que possui apenas um ou dois   impulsos no Jetpak e que Ryan deve se concentrar em agarrar-se em algo, ambos colidem contra a estação e se separam, Ryan acaba presa nos cabos do para quedas do módulo de emergência que havia sido acionado por falha , segurando  Kowalski pelo cinto de segurança; Naquele momento Matt representa a segurança, mesmo na pior hora ele está ouvido música e com um sorriso calmo nos lábios, é companheiro e bem humorado, além de experiente, sem ele, Ryan tem de tomar as decisões, tem de ter a iniciativa e confiar em si mesma; tal como sair da casa dos pais ou deixar o filho seguir sua vida, abandonar a ideia de segurança de uma presença é um fato que se deve encarar pois essa mesma presença não depende de nós. E assim, para salvar a Dra Stone,  Kowalski se solta do cinto de segurança e parte pelo espaço ,  só restando a Ryan Stone aceitação de deixar partir.
não se pode prever nada, não se pode se agarrar a ninguém 

 Matt vai aos poucos se afastando (em um erro físico do filme que se justifica pela alegoria) enquanto a Dra Stone balbucia que o estava segurando e, enquanto , quase sem ar, fica dizendo que não vai desistir de buscá-lo,  Matt liga novamente a música e vai desaparecendo no infinito, mas não sem antes deixar sua última mensagem:
“Uau !...Ei Ryan... Você tem que ver o pôr-do-sol no Gânges... é maravilhoso!”
 Aproveite o passeio, pois é o que a vida é! Não podemos prever nada, temos a ilusão de principio e fim em tudo que fazemos, tal como uma corrida, somos tão condicionados a pensar dessa maneira, que na maioria das vezes não estamos conscientes das maravilhas que acontecem ao nosso redor, nos desprender e aproveitar a paisagem e a sorte de estar presente dá sempre sentido a tudo, basta apenas aproveitar o “passeio de Domingo”.

 Após conseguir entrar na E.E.I , já sem oxigênio e desesperada, Ryan Stone se livra do traje espacial e fica flutuando silenciosa em posição fetal, ali nasce uma nova pessoa, livre da ataraxia que a escravizava anteriormente, renascida da dificuldade que enfrentou. Essas dificuldades superadas são o que lhe dão força para seguir na ideia sugerida por Matt para voltar para casa, e, após enfrentar um incêndio, desacoplar o módulo e sobreviver mais uma vez a passagem dos destroços (que dão uma volta na órbita terrestre a cada noventa minutos) a Dra Stone percebe que não tem combustível para os propulsores de decolagem, um balde de água fria nessa nova pessoa que vem surgindo. Tentando contato com Houston, ela acaba na frequência de um rádio amador  Chinês, o homem , que não fala Inglês e que acha que o nome dela é “May Day” , tem cães latindo ao seu redor e canta para um bebê, reconfortada por essa lembrança de um lar e pelo testemunho do carinho de um pai por um filho, A Dr Ryan decide desligar o oxigênio e morrer. Nesse instante o inusitado ocorre, do lado de fora, na escotilha podemos ver Matt  Kowalski batendo e após girando a trava para a entrada.  Kowalski volta sorrindo, pois bateu o recorde de caminhada espacial, reclama que o clima está meio triste ali e pergunta se Ryan já encontrou a vodca, logo em seguida diz que a estação Chinesa fica a 160 km do lugar onde eles estão, Ryan tenta dissuadi-lo dizendo que não há combustível, mas Matt questiona se ela tentou os propulsores de pouso, pois pousar e lançar é a mesma coisa, Ryan diz que sempre falhou nos treinamentos, então Matt pergunta se ela quer ou não sair de lá, ela não responde; Ryan já havia desistido, se acomodado e aceitado a situação, assim como quem se prende a rotina e se acostuma com uma vida mais ou menos, ela encontra uma nova segurança naquele módulo espacial, justifica sua comodidade com a falta de sucesso do passado,como Matt lhe diz, é calmo lá em cima, é tranquilo e silencioso, ali ninguém pode machucá-la, ela pode fechar os olhos e esquecer tudo, não é preciso seguir em frente, não é preciso viver, sua filha morreu e não há nada pior do que isso, mas a questão é: “O que vai fazer agora?” ...se decidir voltar, vá em frente, coloque os pés no chão e siga em frente.... Então Matt desaparece, ele era a projeção de seu subconsciente procurando alternativas para sobreviver, projetando para Ryan a pessoa que mais lhe inspirava confiança e motivação. Ryan então religa o Oxigênio e decide viver, está na hora de voltar para casa.

 A decisão de tentar novamente, mesmo tendo de enfrentar um problema que nunca conseguiu solucionar, no caso o pouso do módulo Soiuz, e viver, colocam um sorriso pela primeira vez no rosto da Dra. Stone depois de mais de uma hora de filme, acionando os propulsores de pouso do módulo ela ainda pede a Matt uma última coisa que cuide de sua filha, deixando claro que ela está disposta a sobreviver. Retomando seu foco, Ryan consegue desacoplar o módulo e lançá-lo, de forma  que passe próximo a estação espacial chinesa , que já apresenta queda de altitude, assim como em nossas vidas, onde devemos arriscar caso queiramos mais e usar sempre a criatividade para encontrar a melhor forma de se conseguir o desejado,A Dr Ryan salta do módulo e alcança a estação com o uso de um extintor, proporcionando uma das últimas cenas de tensão do filme, quando só consegue se prender a estação no último minuto (malditos clichês Hollywoodianos!) . Já dentro da Estação chinesa, a Dra. Stone ainda tem de tentar a a sorte em decifrar um painel de controle em mandarim, proporcionando um momento engraçado ao apertar o botão errado e soltar a máxima “No hablo chino”.
 Após a estação adentrar a atmosfera, ela começa a se desfazer , soltando o módulo de segurança Chen-zu , onde se encontra a Dra Stone, Essa , de ânimo renovado , transmite agora a segurança e calma que Matt passava no inicio da crise onde os dois acabaram envolvidos. Com o módulo em queda livre, Ryan tenta mais um contato com Houston e , sorrindo, diz que tem um mal pressentimento sobre a missão, diz que existem apenas dois resultados possíveis, ou vai se salvar e terá uma grande história para contar, ou morrerá queimada em dez minutos, mas que não importa, de qualquer maneira será uma experiência incrível; Já não é fim, mas a viagem que a Dr Stone entende como meta, agora ela entende que tudo que ela viveu e sofreu, a definem e a enriquecem , ela aceita o que vem com bom grado , pois o importante é estar presente e ter vivido tudo o que viveu. O módulo cai na terra em meio a um pântano , em uma última provação, Ryan tem de se livrar do traje espacial para não morrer afogada e nadar até a margem de um lago, mais uma vez ela deve deixar tudo o que passou para trás e seguir em frente apesar das dificuldades; ela sai da água se arrastando e se ergue lentamente, representa a evolução, tanto da espécie como da maturidade, sai da água e vai para a terra, começa deitada e sem força, tal qual um bebê, engatinha, caminha vacilante e depois se ergue imponente, quando a câmera a fima nesse instante, ela é uma gigante; a Dra. Stone agora realmente dá razão ao seu nome ( pedra em Inglês) sai endurecida e forte da situação, mas nem por isso menos grata pela sorte que teve e vai em frente sem olhar para trás.

A cada tropeço , um novo nascimento



 Na minha opinião, “Gravidade” é o filme do ano! Certamente  Alfonso Cuarón levará o Oscar de melhor diretor, assim como  o filme levará a fotografia , a parte técnica e , se bobear, de melhor atriz para Sandra Bullock . Sobre os efeitos visuais ,poucas vezes vi os efeitos especiais serem tão bem utilizados,servindo com ferramento de auxilio e pano de fundo para a história e não a atração principal como se costuma ver tão frequentemente, o som também é algo que chama a atenção, como o filme se passa no espaço, ele é utilizado além de ferramenta de tenção, também para transmitir o barulho dos objetos no vácuo, por exemplo, quando a personagem da Sandra Bullock usa uma furadeira, é o som de dentro do uniforme que ouvimos, muito bacana! Os ícones de esperança , também são detalhes delicados que aparecem durante o filme, o Alienígena dos “Looney toones” representando O lar, saindo lentamente pela janela da nave destruída ; São Cristóvão, padroeiro católico dos viajantes, na estação internacional, passando a ideia de fé no retorno; e, buda, quando Ryan já se encontra voltando para a terra decidida e em paz, representando a iluminação . Por essas e por outras é que digo que gravidade é um filme como a tempos não se fazia e que escolhi sendo como o melhor do ano e talvez o melhor em anos, se estiveres a deriva, deixe-se atrair por esse filmaço e aproveite a viagem , mas por favor, verifique se no tanque de oxigênio há mais do que 10% de O² , pois tu vais precisar !


sim, ver esse filme foi uma experiência Incrível